Tuesday, 14 February 2012

Valentim



Madrigal Triste
- I -

Que me interessa que sejas sensata?
Quero-te bela, quero-te triste! Dão-te
Ao rosto outro encanto as lágrimas
O rio transforma a estética da paisagem.
A tempestade torna as flores mais jovens.

Sobretudo excitas-te quando a alegria
Se apaga na tua cara aterrada,
Teu coração na angústia perde o pé
A nuvem horrenda do teu passado
Paira sobre o teu presente e nada és.

Quando esses olhos grandes se enchem
De lágrimas de sangue, adoro;
Quando a minha mão te embala em vão,
Nas angústias que te pesam demasiado
E respiras agonia pelos poros, adoro.

É volúpia divina, um hino
Profundo e delicioso, sorver
Todos os soluços do teu peito
Teu coração brilha com as pérolas
Que a eito te caem dos olhos, acredita

- II -

Eu sei que o teu coração transvaza
De velhos amores de raiz rasa,
Como sei que ainda agora é uma forja
E que no teu peito se aloja
Um resto de orgulho de exilada

Mas enquanto, minha cara, teus sonhos
Não forem além do grão escolho,
E num contínuo pesadelo sem tréguas,
Repleto de espadas venenos e éguas
Apaixonadas pela pólvora e pelo ferro,

Não confiando em alguém desconfiado
Por o perigo ubíquo decifrando,
Além de frágil porque a hora cai,
Tu não tiveres sentido como se esvai
Do abraço um nojo irresistível,

Tu não poderás, serva e rainha,
Que me amas com temor sendo minha,
No horror da noite insalubre
Dizer-me com a alma de um só grito:
"Ó meu rei, nada nos separa no semelhante."

'As Flores do Mal' - Charles Baudelaire

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